Já muito se falou da grandiosa conquista que o fado conseguiu ao ser reconhecido como património imaterial da humanidade, muitas foram as manifestações de regozijo perante tal condecoração, faz bem ao ego nacional e certas intervenções foram acompanhadas da já habitual histeria em torno de algo, que outros conseguiram, mas que a maioria do povo português gosta de se colar por mera conveniência, como se alguma vez tivessem feito algo para que essa condecoração e reconhecimento fosse possível.
Afirmo isto baseado na minha experiência pessoal e que por aquilo que já li e presenciei equivale à maioria da população que cresceu num ambiente livre e democrático, ou seja, no pós 25 de Abril.
Quem não se lembra da forma depreciativa com que o fado foi brindado ao longo destas últimas quatro décadas? Quem é que não gozou com aquela forma triste e deprimida de cantar? E não me refiro apenas ao cidadão comum, mas sim, a gente com responsabilidades públicas, mas que agora, ao perceberem o tardio reconhecimento a nível mundial encostam-se proferindo discursos em prol de uma das principais imagens de marca do nosso país, que tal como muitas outras imagens de marca, são por nós denegridas, enfim, questões culturais e de uma mentalidade que nos acompanha à séculos e pelo andar da carruagem nunca se irá desvanecer.
Contudo, há que reconhecer que existem exceções, pois a geração dos meus pais e dos meus avós, pelos vistos é que estava certa, como em muitas outras situações andavam avançados no tempo e por convicção foram protegendo e divulgando o fado contra uma geração com dificuldades em respeitar as suas origens.
Neste particular aproveito para homenagear o meu pai, pois sempre me habituei a ouvi-lo falar sobre o fado como algo extraordinário e eu não conseguia perceber tamanha satisfação pelas razões acima mencionadas, ao invés, aproveitava esses momentos para fazer alguns comentários jocosos, contudo, tenho a meu favor a humildade de reconhecer o quanto estava errado, embora não tenha responsabilidades públicas, no que diz respeito a esta temática.
Julgo ter sido bastante esclarecedor, não é o prémio recebido pelo fado que me incomoda, não é toda aquela publicidade em torno deste acontecimento que parece ter o condão de monopolizar todas as atenções, fazendo parecer que o país não tinha nem tem outras preocupações, mas sim, a forma impostora de pessoas que pensavam e agiam como eu, de repente por mera conveniência e com segundas intenções na tentativa de retirarem beneficíos disso, passaram a publicitar o fado como se este tivesse algum dia sido, um assunto que lhes interessa-se.
Para aqueles que gostariam que eu chama-se as pessoas pelos nomes, digo-vos apenas para estarem atentos às notícias difundidas pelos vários canais de televisão, aos jornais, rádios e revistas que diariamente preenchem os espaços que frequentamos, quer sejam eles cafés, restaurantes, bares ou bibliotecas, por último e a meu vêr o mais grave, aos políticos e dirigentes que discursaram com sorrisos de orelha a orelha sobre matéria tão séria, como é, a do fado lusitano.
Resta-me dirigir algumas palavras a todos aqueles que verdadeiramente gostam de fado e que fazem parte daquela esfera musical, que engloba os interpretes, os escritores e os músicos, além de todo o seu público, quer sejam figuras públicas, quer sejam anónimos que ainda são a grande maioria, e que tomei a liberdade de dar como exemplo, o meu pai.
A todos parabéns, pois vocês merecem título tão honroso que o fado conquistou por direito próprio ao ser reconhecido em todo o mundo.