sexta-feira, 24 de setembro de 2010

O triunfo do Chico-espertismo!!!



Há muito tempo que desejava escrever sobre este assunto (Novas oportunidades), mas como não queria colocar "tudo" no mesmo saco andava a adiar. Hoje enquanto lia a imprensa diária, eis que um jornalista do jornal Expresso (Tiago Mesquita) influenciou-me a publicar neste humilde blogue o seu artigo sobre o estado do ensino na minha pátria. Vamos lá então...

"Na Faculdade sem terminar o Liceu, não restam dúvidas que o mundo é dos espertos. E Portugal tem dado um contributo importante. Tempos houve em que mudámos o mundo a bordo de uma Nau. Agora é mais fácil, temos o Novas Oportunidades. Perguntem ao Tomás.

No que toca à esperteza saloia ninguém nos dá lições. Portugal é uma espécie de extensão europeia da América latina à beira mar plantado. É só apanhar o barco e navegar. Aqui tudo é possível. E com os exemplos que nos chegam de quem tem responsabilidades, o que poderemos exigir? O chico-espertismo está instituído.

O Expresso contou-nos esta semana a história de Tomás. Um rapaz que como tantos outros apenas queria uma oportunidade. A diferença é que enquanto os outros estudavam para a merecer o Tomás foi-se inscrever no Centro de Novas Oportunidades de Esposende. E bem. Foi esperto. Há quem compre pneus novos e quem prefira recauchutar. Há os que efectivamente estudam alguma coisa e os que fazem parte do processo de maquilhagem educativa em curso. Já conhecíamos o "jornalismo travestido" agora temos "o acesso ao Ensino Superior travestido".

O Tomás, que havia desistido da escola porque a Matemática era uma pedra no sapato, descalçou-se em Esposende e em meia dúzia de meses acabou o 12º ano com a pedra na mão. Como? Frequentou dois módulos (saberes fundamentais e gestão). No primeiro provavelmente ensinaram-lhe a apertar os sapatos e no segundo a gerir a semanada. Mas resultou. Parabéns. Mais um para a lista de sucessos do Ministério.

Mas o mais "divertido" foi que com esta manobra o Tomás acabou por ser oficialmente, segundo as listas do Ministério do Ensino Superior, o aluno com a mais alta nota de candidatura do país: 20 valores. Virou-se o feitiço contra o Ministério da Magia. Estou a imaginar o Tomás com a pedra na mão e um rafeiro atado a um braço, os dois a olharem para a pauta: "está a ver Einstein? Quem é que é esperto? Olha-me só para estes totós todos..." Terá dito o génio ao canídeo. Resta agora saber quantos entraram no Ensino Superior nas mesmas condições. Graças ao maravilhoso Novas Oportunidades.

"Acabou por entrar na faculdade, no curso de Tradução, na Universidade de Aveiro. Como a sua média não tem em conta as notas do secundário - que não terminou - e baseia-se apenas no exame nacional de Inglês, o único que teve de fazer para entrar em Tradução e onde conseguiu nota máxima" conta o Expresso. Pelo meio Tomás ainda tentou Biologia mas teve 7,4 de nota. Pois é... "como ocorre a gametogénese e mais não sei o quê, cenas bué complicadas meu...foi mau"

Penso nas pessoas da idade do Tomás que se privaram de milhares de outras coisas da sua juventude para estudarem (e bem) e poderem escolher o curso que pretendiam frequentar, muitas delas ainda com o amargo de boca do insucesso, e no que pensarão e sentirão ao ler esta notícia. E só lhes posso dizer uma coisa para as animar: ponham os olhinhos no Tomás, porque este rapaz ainda chega a Primeiro-Ministro."



Nota do autor: Ainda bem que alguém se lembrou de escrever sobre isto e que publicou num meio de comunicação social de grande escala, pois eu já andava a pensar que só eu é que me apercebia destas coisas e sabem como é, às tantas ainda passava por maluquinho e isso eu não quero. No entanto, tenho que dar continuidade a este tema , não porque esteja obcecado, mas por uma questão de justiça para com este jovem, de seu nome Tomás.

Não tenho qualquer dúvida que este artigo em termos gerais desmascara a pouca vergonha que este programa "milagroso" que transforma pessoas com 6º, 7º, 8º e 9º ano em estudantes universitários e como se isto não bastasse é anunciado com grande pompa e circunstância e em alguns casos com honras de estado devidamente divulgadas através da comunicação social. Tenho conhecimento através do estudo (pois não sou desse tempo) que alguns antigos regimes autoritários usavam este tipo de manobras, mas agora não, agora estamos em democracia!

Contudo, justiça seja feita. O Tomás não passa de um "saco de pancada" no meio disto tudo e ainda por cima injustamente senão reparem.

O Tomás andou no ensino secundário, o seu único problema foi não ter conseguido fazer a Matemática, como muitos milhares de outros estudantes que anualmente frequentam o nosso sistema de ensino. Este jovem também esteve sujeito ao estudo, aos testes, aos exames, à pressão que quem frequenta ou frequentou este sistema de ensino cada vez mais fora de moda sabe. Além de tudo isto, o jovem em questão escolheu a via dos exames nacionais para ingresso na Universidade em vez de utilizar o caminho mais confortável da realização de testes propostos por cada uma das Universidades com o objectivo claro de cativar novos "clientes", testes esses com critérios de exigência muito aquém daqueles que se praticam nos já referidos exames nacionais.

Possivelmente, os futuros colegas do Tomás no curso de tradução da Universidade de Aveiro, também não fizeram nem tiveram como disciplina a Matemática, pois vieram da área das Humanísticas e/ou Letras.

Por tudo isto, é caso para perguntar:

- Se este jovem é tratado da forma que está a ser, então o que dizer daqueles que nunca frequentaram o ensino secundário, nem precisaram de fazer exames nacionais para entrarem na Universidade juntamente com ele?

Para o Tomás, aqui deixo uma palavra de apreço, pois tu ainda tiveste o mérito de obteres 20 valores num exame nacional, mais propriamente o de Inglês, o que juntamente com a frequência no ensino secundário, na minha opinião dá-te o direito e o mérito de frequentares o curso superior que pretendes.

Boa sorte Tomás, julgo que a maioria da opinião pública se enganou no alvo, mas tens que compreender, tu deste nas vistas devido à excelente nota que conseguiste no exame nacional de Inglês, o "povinho" é que de imediato tratou de vulgarizar o teu grande feito, o que também é normal nesta nossa sociedade que tanto gosta de viver das aparências.

Tens de perceber que tu és apenas um e por isso é muito mais fácil de "bater", pois aos outros que entraram no Ensino Superior da forma que em cima já explanei, são muitos, e por isso muito mais difícil de lhes "bater", certamente não teria o mesmo impacto, rapidamente seríamos abafados pela multidão.

Um dos vários slogans criados para promover esta campanha comprova esta minha ideia quanto ao número de cidadãos já "formados":

- "Já somos mais de um milhão, mas podemos ser muitos mais!"

Pois muito bem, se o nosso Governo da República entende que esta via de ensino promove tão bons resultados como aqueles que nos quer fazer querer, porque não utilizar este mesmo sistema de ensino com as nossas crianças, adolescentes e jovens que como se diz por aí serão os homens e as mulheres de amanhã, ou melhor ainda serão a garantia de um futuro próspero, rigoroso e competente, eu pergunto:

Com que bases?

Quero lembrar aos nossos governantes que esta medida acima proposta, principalmente num período de crise sócio-económica como nunca se viveu, só trás vantagens, pois desta forma poderia-se poupar em livros, manuais, material escolar e transportes, visto que na maioria dos casos os candidatos só precisam de aparecer duas ou três vezes por mês no centro de novas oportunidades onde estão inscritos para apresentarem trabalhos realizados sabe-se lá por quem, enfim, tanta poupança numa pequena lista de recursos que não são precisos para esta nova via de ensino.


Não me interpretem como um radicalista, pois julgo usar de bom-senso e apenas estou a comentar factos e medidas tomadas à vista de todos, o problema poderá estar na interpretação, mas se juntar-mos a tudo isto que referi uma das últimas medidas governamentais que consiste em acabar com a alternativa do ensino secundário pós-laboral, não me deixa margem para interpretar esta propaganda de outra forma, ou seja, Novas Oportunidades é o caminho a seguir.

Não me vou alongar mais, pois este é apenas mais um caso que mostra bem as desvantagens das minorias, mas provavelmente, é por estas e por outras que gosto de me incluir nelas.

1 comentário:

  1. Concordo com tudo aquilo que este artigo divulga. Porque, o verdadeiro ensino nas novas oportunidades não existe. Existe sim, uma forma de validar os ensinamentos adquiridos ao logo da vida, e as\os professores\as não ensinam, só orientam nos trabalhos propostos….
    Mas o que vamos fazer se no próprio governo, alguns elementos saltaram a cadeira de matemática? Basta ver como está o país ao nível das finanças, é mesmo de quem não sabe fazer contas, lol, lol…
    Queria deixar algumas perguntas no ar:
    - Será que está a ser criado um novo tipo de descriminação social?
    - Será que daqui a alguns anos este tipo de ensino será valorizado pelos nossos empresários?
    - Ou será que no futuro vamos ouvir perguntas sobre que tipo de 12º ano é que se tem?

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